Conheci Sempre Vivemos no Castelo por causa do maior spoiler do livro, e apesar de normalmente não ligar para spoilers, quase que não o leio por causa disso. Mas, ainda bem que meu interesse foi maior que minha decepção.
“Meu nome é Mary Katerine Blackwood. Tenho dezoito anos e moro com a minha irmã Constance. Volta e meia penso que se tivesse sorte teria nascido lobisomem, porque os dois dedos médios das minhas mãos são do mesmo tamanho, mas tenho de me contentar com o que tenho. Não gosto de tomar banho, nem de cachorros nem de barulho. Gosto de minha irmã Constance, e de Richard Plantagenet, e de Amanita phalloides, o cogumelo chapéu-da-morte. Todo o resto da minha família morreu.”
Publicado em 1962, o livro nos convida a conhecer a historia da família Blackwood, que depois de uma tragédia passa a contar com apenas três pessoas: Constance, tio Julian e Mary Katherine, conhecida pelo apelido de Merricat, e é ela quem nos narra toda a trama. Esse fato pode ser considerado como a primeira grandiosidade do livro, será que a Merricat é uma narradora confiável? Até que ponto o que ela nos diz é a realidade e até que ponto está impregnada com as impressões dela? O livro não nos responde nenhuma das questões, não sabemos as motivações por trás do crime cometido contra a família, pelo contrário, a autora nos convida a pensar, a procurar detalhes na história e coloca em cheque nossa afeição pelos personagens, tudo isso em apenas 200 páginas.
Apesar de desconhecida do público brasileiro, Shirley Jackson é uma das autoras mais importantes dos EUA, tendo influenciado escritores como Stephen King e Neil Gaiman, sendo figura constante nas leituras obrigatórias dos colégios e um dos principais nomes americanos do gênero literário de horror.
Confesso que nunca havia ouvido falar da autora até ler Juntando os Pedaços, da Jennifer Niven, mas naquele momento eu soube que precisava dessa história, cujo enredo falava sobre duas irmãs que haviam perdido os pais envenenados por arsênico e viviam isoladas e hostilizadas pelos vizinhos. De forma geral, esse tipo de gênero não faz meu estilo, no entanto, agora estou ansiosa para ler The Lottery, conto que discute a conformidade humana ao apresentar um dos possíveis caminhos que grupo de pessoas podem trilhar e colocar em perspectiva a realidade um tanto quanto sombria e impetuosa das crenças. Nele, acompanhamos a Loteria, um acontecimento anual que ninguém sabe muito bem quando começou, mas que se tornou uma tradição inquestionável apesar do horror e das implicações que gera. Não quero falar muito para não dar spoilers, mas tenho certeza absoluta que não deixa nada a desejar aos contos do Adgar Allan Poe.
Voltando a Sempre Vivemos no Castelo, é interessante observar que a despeito do crime ter ocorrido há 6 anos, os integrantes da família que restaram parecem ter parado no tempo. Não só as idades em relação aos comportamentos são discrepantes, a própria casa é mantida da mesma maneira como no dia da tragédia, os livros pegos na biblioteca jamais foram devolvidos e os únicos momentos em que há uma fuga dessa realidade estagnada é quando o tio, que parece estar caduco, trás à tona o dia do crime, tenta lembrar e entender o que aconteceu. Mas essa fuga não se mantém, então ficamos o tempo todo acompanhando a obsessão do tio com os escritos que nunca são concluídos, enquanto a Merricat e a Constance repetem dia após dia os mesmo comportamentos e até as mesmas conversas.
Merricat, disse Connie, você não quer uma xícara de chá? Ah, não, disse Merricat, você vai me envenenar.
Sempre Vivemos no Castelo é uma história fluida, misteriosa e sombria com a personagem mais estranha e cativante que já vi. E o final, que final! Vale muito a pena ser lido, ainda mais agora que estamos no mês do horror. Fica a dica!
Nota:
Merricat inesquecível |
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Taiany Araujo
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