Queerbaiting é um problema sério que acontece com representatividade LGBT+, mas dizer que qualquer coisa é queerbaiting não ajuda ninguém. Hoje eu vi um texto sobre o Poe e o Finn de Star Wars que me fez ficar pensando e decidi compartilhar aqui. (era pra ser uma thread no twitter, mas..)
queerbaiting pra quem não sabe é a ideia de usar algo LGBT+ como isca pra atrair audiência LGBT+, sem de fato entregar algo. Desse modo, você se torna uma série/filme popular com esse público, sem fazer representatividade de verdade.
SÓ QUE no meio disso, eu tô vendo muita gente usar queerbait pra qualquer problema de representatividade LGBT+. O fato é que na realidade tem mais nuance que isso, porque rep LGBT+ é muito fodida e normalmente já é invisível. Tem caso de subtexto, que é tipo: os autores querem que seja LGBT+, mas por causa de homofobia não são permitidos colocar abertamente. Às vezes o subtexto + fandom shippando no mundo real pode dar o empurrão pra mostrar que é bem aceito.
korrasami foi escrito como subtexto por 2 temporadas porque os autores pensavam que não iam deixar escreverem abertamente por ser um desenho da Nickelodeon (e o beijo ainda foi proibido) |
Tem caso de lente hétero, que é quando os fãs veem que é possível e acham um casal maravilhoso junto, os próprios escritores não enxergam porque Heteronormatividade e dizem "que não tem nada ali". Alguns desses escritores, inclusive, até falam abertamente que não vai acontecer. Acho que Sherlock foi um desses casos, não tenho certeza. Mas vários escritores já falaram que não escreveram algo com essa intenção. Então é queerbait onde?
Queerbaiting é literalmente usar os fãs queer pra ganhar a audiência, prometendo entregar, mas sem fazer nada. Se eles falam que não vão fazer e os fãs ficam ali na esperança, ainda é um problema e não é culpa dos fãs que aprendem a viver com migalha de representatividade, mas não é queerbaiting.
E um resultado muito comum da lente hétero é que, no caso de série (em filme nem existe representatividade LGBT+), isso normalmente se traduz em um personagem secundário LGBT+ aparecendo ou fazerem um episódio temático só pra dizer "Yey, nós gostamos dos gays, agora larga os nossos protagonistas". Às vezes é até representatividade boa de fato, apesar de sempre marginalizada por não ter protagonismo. Novamente, é um problema que precisa ser discutido, mas é outro problema.
Lembrete de que queerbaiting e os problemas são sofridos por pessoas lgbt+, não gente hétero que gosta de coisa lgbt+.
Tem também representatividade ruim, que é a maioria. Mas é tipo, eles dizem OLHA AQUI A REPRESENTATIVIDADE, só que é aquela coisa secundária, estereotipada, que nem tem espaço. Então você fica sentido que prometeram mais do que entregaram, mas ainda não é queerbaiting, eles tentaram cumprir, só são ruins e tem provavelmente muito homofobia internalizada e não conseguem ver potencial pra os personagens LGBT+.
Um exemplo é de Power Rangers (2017), com a garota que é queer. Apesar de ser uma representação bem superficial, tem a ver com a personagem e o momento que ela tá ali. Podia ser escrito melhor? Sim. Mas não colocaram ela ali só pra atrair o povo. Eles realmente queriam ter representatividade e fizeram.
E tem caso de série que nem termina ou é parte da narrativa. Por exemplo, Faking It - Karmy não era queerbaiting. Primeiro, que a série desde o episódio um era abertamente LGBT+ e discutia questões, seguiu a Amy ficando com garotas e garotos e até namorando. Quanto a ela e a Karma, desenvolveu abertamente que a Amy tinha sentimentos, enquanto a Karma não, chegando ao ponto da Karma dizer isso pra Amy. Isso é a coisa mais longe de queerbaiting que existe. Algo LGBT+ explícito, a possibilidade de relações entre ela sendo considerada abertamente como tema de episódio - enquanto normalmente os autores só fingem que não existe. Inclusive, parte da temática da série é que a Amy começa a gostar da melhor amiga e a amiga não sente o mesmo. Eles não estão ali falando VAI TER sem entregar nada. O ship pode não ter acontecido, mas é diferente de falar OLHA OS GAY. PERA, ERA MENTIRAAAA.
E depois, mesmo assim, quando a série foi cancelada o showrunner disse que pretendia fazer um dia ser canon. Eu parei de assistir por causa da bifobia e história superficial, mas é diferente de queerbaiting.
Existe uma diferença entre querer fazer, ou se aproveitar sem fazer nada.
O próprio queerbaiting acontece de formas diferentes. Pode ser uma narrativa ali, que dá indícios só pra atrair o povo, mas com o eterno #nohomo.
Tem o pontual, que não acontece nem na história em si, mas na propaganda. O que acontece é que casais de mesmo gênero carregam fandoms enormes e dedicados, resultando na equipe de divulgação vendo que falar sobre funciona pra atrair o público e aí começam a usar isso na divulgação nas redes sociais. Uma cena junto na promo do episódio aqui. Um "ADIVINHA QUEM VAI APARECER NESSE EPISÓDIO?" ali e por aí vai.
Uma coisa que aconteceu em Supergirl esse ano foi anunciarem um episódio "Centrado na Alex com a Maggie", quando no episódio em si só tinha uns 5 minutos e focava no relacionamento da Kara com o Mon-El. "Ah, mas a Kara é a protagonista.." - ENTÃO PRA QUE VOCÊ ANUNCIA QUE O EPISÓDIO É CENTRADO?
OLHA AQUI, GENTE, VAI TER ESPECIAL DE SORVETE NA MINHA PIZZARIA ESSE DOMINGO.
*todo mundo chega lá e tem aquela mesma pizza com uma bola de sorvete que tem todo dia*
Isso é literalmente prometer e não cumprir - queerbaiting.
Mas a Alex e a Maggie como um todo é queerbaiting? Não. Pode cair em não ser bem escrito ou no caso de lente hétero, mas foi feito pra ser representatividade e fizeram de verdade. Discutir queerbaiting é discutir essas nuances.
Outro caso de queerbaiting mais pontual é o caso da morte da Lexa em The 100, porque de fato usaram a personagem pra divulgar a série e o showrunner Jason Rothenberg chegou a dizer na cara de um fã "você tá vendo coisa demais em pensar que ela vai morrer" e dizer coisas como "sempre tem esperança", quando a personagem já estava morta por decisão dele. Eles literalmente falaram pra os fãs que isso não ia acontecer, o episódio da morte dela foi anunciado como "O QUE VOCÊ NÃO PODE PERDER" e até "ONDE O SHIP VAI FICAR JUNTO PRA SEMPRE". Esse é um caso muito sinistro, porque todo mundo meio que sabia que ela ia morrer - personagem secundária, guerreira, lésbica, em uma série onde todo mundo morre, e nem era do elenco principal. Então os escritores foram muito além do normal pra desmentir a morte dela. Só que ela morre.
e eles sabiam do trope de personagens lésbicas morrendo |
Agora compara isso com Faking It, onde estavam de fato desenvolvendo a história e fazendo acontecer e ninguém prometeu que elas iam ficar juntas.
O problema do queerbaiting é que você pega um público que já não tem representatividade, que vive de shippar casais que são tratados como ilusão e ridículo (imagina se vai ser gay mesmo, né? hahaha), porque é isso ou não existir, um público que muitas vezes cresce em ambientes homofóbicos com medo e ignorando o que sente, aí você atrai dizendo DESSA VEZ VAI e não vai a lugar nenhum. Tipo acontece em A Bela e a Fera.
O que me levou a esse texto aqui é um comentário que eu vi sobre o Finn e o Poe, de Star Wars, e... eles são queerbait? No momento, eu diria que não. Primeiro, porque no filme em si não tem nada explícito e ninguém vendeu como OLHA AQUI O CASALZINHO. É claro que o Oscar Isaac (ator do Poe) pode ou não ter interpretado assim, ou querer que seja, e até ter gente da equipe que quer que seja, mas ninguém tá prometendo nada. Podem até falar um "quem sabe", mas aí a gente vai ter que assistir o próximo filme pra ver o que, de fato, eles vão fazer. Dependendo de como for, a conversa muda.
Eu não acho que é muito saudável intitular "queerbait" qualquer coisa que seja "considerada ser queer", porque essa liberdade pra fazer headcanon e falar sobre o próprio desejo, importa demais. Importa porque "considerar" às vezes é o único tipo de representatividade que as pessoas tem (QUANDO É A PRÓPRIA PESSOA LGBT+ CONSIDERANDO. SE O ESCRITOR CONSIDERA, MAS NÃO FAZ NADA, A GENTE MANDA É SE FODER) - não dá pra vilanizar e criticar as pessoas por quererem se ver e encontrarem a si mesmas nas rachaduras, porque isso é a única coisa que elas normalmente têm. E, além disso, importa porque mostra pra indústria ou escritores a demanda por esse tipo de conteúdo e pode ser o empurrão final pra fazerem ser canon.
Representatividade LGBT+ tem muito problema, quando chega a existir, e queerbaiting é um deles. É importante ficar atento e, se possível, não se render a falsas promessas. Mas queerbaiting não é a única coisa que existe e nem tão simples assim.
obs: só pra constar, no fim do dia, os próprios fãs sabem as merdas que passam na mão dos escritores, acho que o queerbaiting que a gente mais encontra é aquele que atinge só fã mesmo, porque é um escritor comentando no twitter, outro falando numa entrevista, uma foto no dia X no contexto Tal no twitter. Pequenas coisas que vão criando uma esperança falsa. Então você é quem no fim do dia julga se você tá sofrendo.
obs2: gente hétero não sofre queerbaiting, ok? existe uma razão pra o nome ser "queerbaiting" e não "falsa promessa", e é que considera o contexto que as pessoas LGBT+ vivem de nunca terem representatividade e até coisas como dar a mão ou insinuar é censurado. quando queerbaiting acontece, gente hétero perde um ship bonitinho, gente queer perde a oportunidade de ser humanizado e existir sem ameaça.
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1 comentários
Finn e Poe são queerbaiting sim!!!!! Caso não saiba, quando atores tão divulgando projetos a equipe de marketing/publicidade por trás fica de olho no que está rolando no fandom, e dá orientações ao elenco do que dizer nas entrevistas. Depois do ep. VII que começaram com as fic/fanarts dos dois personagens os atores começaram a dar entrevistas falando coisas do tipo "Meu personagem gosta MUITO dele" etc, mas nunca especificavam em que sentido eles se gostavam, era sempre algo evasivo com mil interpretações. E com Os Últimos Jedi foi a MESMA coisa. Para divulgar Os Últimos Jedi fizeram BASTANTE promo para a personagem supostamente queer e no filme a mesma nem comenta nada sobre sua orientação sexual, no máximo tem uns subtextos entre ela e a Leia. Novamente queerbating. Isso acontece bastante com séries também.
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