Imagine que você está ali de boa conversando com seus amigos, curtindo o bloco de carnaval quando sente alguém cutucar seu pé. Você olha para baixo e vê que tem outro pé cutucando o seu. Olha pro lado e percebe que é um homem o dono do pé cutucador. É carnaval, a praça tá lotada, então você simplesmente afasta o seu pé e volta a participar da conversa com seus amigos. Segundos depois sente novamente algo cutucando seu pé. Olha novamente para o lado e percebe que é o mesmo carinha de antes, dessa vez você pergunta, já sem paciência, o que ele quer? Ele sorri e diz: bonito sapato. Mamãe investiu tantos anos em sua educação, então você se ver obrigada a ser educada; agradece o elogio e logo em seguida vira as costas e volta a fofocar com os amigos. Menos de um minuto você sente alguém tentando desfazer o laço da sua saia. Você dá um tapa na mão e se vira para, mais uma vez, se deparar com o “cutucador” e manda ele parar de perturbar. Seus amigos, que até aquele momento não tinha se tocado do que estava acontecendo, logo percebem o assédio e mandam o cara se afastar. O mané vai embora com medo de apanhar.
A Revista AzMina criou um guia didático da diferença entre paquera e assédio |
Essa não é a sua história (se for, me abraça amiga, pois te entendo). Essa é a minha história e de milhares de outras mulheres mundo a fora. Sofremos assédio diariamente e como disse um dos meus amigos que ajudou a afastar o agressor “isso é tão corriqueiro que infelizmente já é normal”. Seja no carnaval ou em qualquer outra época do ano nós mulheres aprendemos a conviver com o assédio, o que criou uma cultura de normalidade para o ato. E isso me deixou com muita raiva porque ASSÉDIO NÃO É NORMAL! Só porque acontece todo dia não significa que seja normal!
Temos que mudar a realidade e a mentalidade de que cantada não é assédio. Uma coisa é paquera, outra completamente diferente é uma abordagem inconveniente que agride uma das partes.
Assédio é um ato perturbador, que desmoraliza, causa constrangimento, angústia, raiva, humilhação e que deixa você sem reação. Já a paquera é um ato que é pautado na palavra reciprocidade.
Se existe consentimento de ambas as partes é paquera; flerte. Na paquera existe sinais claros de interesse, mesmo que não sejam verbais. Agora se um dos lados não quer e se sente constrangido com o elogio e a insistência, claramente é assédio. Assédio é violência e como tal deve ser encarado com seriedade.Artes da campanha de combate ao assédio sexual em espaços públicos Chega de Fiu Fiu, lançada pelo Think Olga |
Nos acostumamos com o comportamento agressivo como se fosse “coisas típicas de homem”, como se fosse algo normal, natural. Os garotos são educados para falar qualquer coisa que passam por suas cabeças, para tomar a iniciativa na arte da conquista. Já as garotas devem ter cuidado com o que falam, ser passivas e se tomarem a iniciativa são encarradas como putas (por sinal você já leu o texto da Bells sobre o fato que algum dia você vai ser puta?).
Na construção do conceito de masculinidade atrelaram a ideia equivocada que o homem tem que tomar aquilo que ele quer, tal e qual o neanderthal popularmente divulgado nos filmes. Particularmente não acredito no conceito que os homens das cavernas puxavam as mulheres pelos cabelos e mesmo que isso ocorresse não é desculpa para milênios depois continuar a perpetuar o ensinamento que os homens devem ser agressivos e tratarem as mulheres como coisas. Não somos coisas. Entenda que “não” significa “não”.
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