cabelo cabelo crespo

Por que deixei meu cabelo natural e criei um projeto sobre isso

2.11.15Colaboradores CC


Há algum tempo, em uma troca de e-mails com a Dana, combinamos que eu iria escrever um texto para CC. Minha vida ficou um pouco tumultuada e, uma falta incrível de criatividade me controlou, que só depois de meses consegui, finalmente, sentar em frente ao computador e começar a escrever meu relato – porque acredito que isso aqui vai ser mais um longo depoimento do que qualquer outra coisa. 


Meu nome é Olívia, tenho 24 anos, sou negra, mineira e formada em Jornalismo. Sempre estudei em escola particular, tanto no ensino fundamental e médio, como na faculdade. E, durante muito tempo, não consegui enxergar o quanto essa parte da minha vida influenciou no resto.

Meu cabelo é crespo. E, desde novinha, eu comecei a relaxá-lo. E, abrindo um rápido parênteses, se você não sabe o que é relaxar o cabelo, aqui está uma rápida explicação: basicamente é passar um produto químico na raiz, que faz com que ele perca sua estrutura natural. Ou seja, diminui o volume e, ao mesmo tempo, pode tornar seu cabelo um pouco mais liso. 

E então vieram as famosas escovas com química. Escova progressiva, escova inteligente, escova isso, escova aquilo. E, como é de se imaginar, entrei na onda. A verdade é que, mesmo nunca tendo falado em voz alta, meu cabelo sempre foi um grande tabu na minha vida. Tanto que tentei de todas as formas modifica-lo. Mas ele nunca iria ficar liso, comprido e brilhante como o das minhas colegas de sala. 

E eu sabia disso, mas o que custava tentar não é mesmo? O que custava tentar ficar o mais parecido com as pessoas que me cercavam? Ou com as atrizes de novela, de série, de livros? Não tinha ninguém realmente parecida comigo, então estava bem óbvio que quem deveria mudar era eu, e não o sistema. 

Alguns anos depois, em setembro de 2013, eu relaxei o cabelo pela última vez. Na época, eu ainda não sabia que seria a última, mas foi. Meu cabelo estava horrível. Sem vida, sem movimento. Eu me olhava no espelho e não gostava de nada nele. Eu precisava mudar, mas não sabia como. 

Até que, a ajuda veio de uma pessoa que nunca teve problemas com cabelo, que tem o cabelo exatamente do jeito que eu sempre achei que queria ter. A ajuda veio da minha melhor amiga. Branca e de cabelo liso. Refletindo sobre isso, percebo como o destino é algo engraçado e que brinca com a gente.

Era dezembro de 2013. Já estava na época de relaxar o cabelo novamente. Mas eu não queria. Ele estava um pouco abaixo do ombro, totalmente sem vida. Eu queria mudar e então falei sobre para minha melhor amiga. E ela, magicamente me enviou um vídeo, de uma vlogueira contando sobre seu processo de transição. E então, minha vida mudou.



Do vídeo, procurei um grupo chamado Cacheadas em transição. No grupo, descobri o cronograma capilar e outras centenas de meninas que estavam passando pelo mesmo processo que eu ou que já haviam passado e estavam desfrutando da maravilha de deixar o cabelo natural. 

Foi ali que eu percebi que o processo ia ser complicado, difícil e que mexeria com minha auto estima de uma forma que eu nunca achei que podia acontecer. Foi ali no grupo que eu encontrei força para continuar. Vi relatos de meninas que tinham passado pelo mesmo, mas tinham sobrevivido. Meninas que, naquela época, esbanjavam seus cachos ou seus blackpower. Meninas que estavam felizes com a decisão que tomaram. 

Um ano depois, após muitas idas ao salão e incontáveis hidratações, eu cortei toda a parte com química do meu cabelo. Finalmente estava livre. Eu chorei no caminho do salão para casa. Eu tinha conseguido. E, mesmo com o espanto dos meus pais, das minhas amigas e de todo mundo que me conhecia, eu não poderia estar mais feliz com aquele corte super curto. 

Isso foi em outubro de 2014. Em janeiro de 2015 eu percebi que precisava fazer algo a mais. Eu queria fazer algo que pudesse ajudar meninas e meninos que estavam passando pelo mesmo, da mesma forma que aquele grupo me ajudou lá no começo de tudo. E então, como uma lâmpada acedendo em cima da minha cabeça, eu criei o projeto digital “Meu Cabelo Crespo é Amor”.



A ideia do projeto era, no início, apenas criar curtas frases de apoio. Depois criei um canal no Youtube e também o Blog. Do Blog eu criei o Manifesto Meu Cabelo Crespo é Amor

Minha finalidade sempre foi afirmar que, mesmo se você não quiser deixar o cabelo natural, você saiba que seu cabelo é lindo de QUALQUER jeito. Não importa se está liso, molhado, cacheado, crespo, blackpower, com turbante, com faixa etc. O que importa é aceitar que, não é porque na sua sala só tem meninas de cabelo liso ou na TV a mesma coisa, que seu cabelo não é tão bonito quanto o delas.

E o processo de aceitar isso é lento e complicado. É entender um sistema que oprime mais da metade de uma população. É entender que você não tem culpa. É entender que seu cabelo é lindo, maravilhoso e perfeito. Seu cabelo é amor, não importa o que eles digam. 


CONHEÇA MAIS
Blog: http://meucabelocrespoeamor.com.br/
Canal: https://www.youtube.com/channel/UCjZ2EusshTzbrCID2wJEy_g
Manifesto: http://meucabelocrespoeamor.com.br/manifesto-crespo-e-amor/
Página: https://www.facebook.com/meucabelocrespoeamor


Autora: Olívia Pilar
Jornalista, Social Media e criadora do projeto Meu Cabelo Crespo é Amor. Twitter: @oliviapilar


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15 comentários

  1. EU SOU CACHEADA, EU LEVANDO BANDEIRA MESMO ISSO, TIRANDO A TRANSIÇÃO, QUE NUNCA FIZ, EU PASSEI E SEI SOBRE O QUE VOCÊ ESTÁ FALANDO, ENTÃO É CLARO QUE ESTOU AQUI BATENDO PALMAS PARA VOCÊ E PARA ESSE TEXTO. PARABÉNS

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  2. Moça, você inspira sabia? Tenho uma amiga que esta em transição, e compreendo o quanto seja difícil, ela também fazia relaxamento. Eu sou branca do cabelo liso, ele era enrolado mas alisei pra me sentir melhor, e não por conta de um padrão, e é isso que a gente quer né? A gente que liberdade e autoestima, a gente quer que as negras se assumam, se amam seus cabelos, que os deixem natural e lindos! Vou fazer um post sobre isso e te citar, parabéns! <3
    http://feministamilitante.blogspot.com.br/

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    1. Oi Ana, tudo bem? Longe de mim ser uma inspiração, só quero que outras meninas(os) saibam que não estão sozinhos!
      Fala pra sua amiga que tudo vai ficar bem ;) <3

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  3. Foi você que me inspirou a cortar meu cabelo edeixa-lo cacheado novamente. Meu muito obrigada.

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    1. Não precisa agradecer NUNCA. Você tem que sentir orgulho de si mesma <3 Parabéns!

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  4. Eu meio que dei uma surtada quando saiu post seu aqui no CC. Primeiro porque eu adoro esse blog e acho um espaço maravilhoso, segundo porque já te sigo no twitter, na sua página, no blog, e te admiro não é de hoje. A junção disso então fez eu ficar super animada!
    Mas, vamos ao post:
    Cabelo sempre foi um tópico delicado pra mim... E senta que lá vem história.
    Minha mãe tem aquele cabelo de comercial de shampoo, sabe? Aquele que parece que já nasceu escovado. Ele é maravilhoso e muitos elogiam isso nela. Meu pai já tinha uns cachos, umas mechas meio onduladas e rebeldes que faziam um super sucesso nos anos 70/80 - agora ele está quase careca, então não vem o caso.
    Eu puxei o meu pai. Só que com muito mais cachos. E sou a única em casa assim, pois ambos meus irmãos tem cabelos lisos como os da minha mãe. A questão é: eu nunca me incomodei até um tempo atrás. O ensino médio, sabe? Aquela época maravilhosa *sarcasmo aqui*.
    Como você eu estudava em colégio particular. Todas as minhas amigas tinham cabelos loiros e lisos e, bom, eu não. De uma sala com mais ou menos 20 meninas, eu era a única sem química no cabelo. E, pra mim, era tudo ok, até que um dia eu fiz uma escova pra ir a uma festa, tirei foto e BANG, comentários de "nossa, por que não deixa o cabelo sempre assim?", "nossa, você fica muito mais bonita desse jeito."
    Pra piorar, um certo tio meu, soltou um "nossa, assim que seu cabelo tem que ser! Você, branquinha como é, com cabelo de preto... fica estranho". Eu não sabia nem com que cara ficar porque o comentário dele foi tão absurdo em tantos sentidos que eu só o chamei de racista e saí da mesa.
    Mas, de volta aos comentários da foto: Eu sei que as pessoas acham que estão elogiando. Mas não estão. Elas me fizeram me sentir inferior por ter um cabelo que sempre achei lindo. Eu fiquei com complexo nisso, comecei a inventar desculpas pra minha mãe dizendo que queria alisar porque dava menos trabalho e podia ser até mais econômico. Cheguei a marcar progressiva três vezes num salão (só que em nenhuma deu certo, graças aos céus), até que, por causa da minha avó materna que sempre amou cuidar do meu cabelo quando eu era criança, decidi investir mais nos cachos e no potencial deles do que gastar a mesma grana pra ficar igual a todo mundo. E aqui estou até hoje, muito graças ao seu movimento que só me dá mais força.
    Infelizmente, por causa de umas medicações aí, meus cachos estão mais disformes, porém já estou consultando a ginecologista pra rever meu remédio e estou apostando em fitagem pra manter o cabelo do jeito que eu gosto.
    Nunca passei por nenhum processo de transição, mas desejo muita força para quem está nessa, pois imagino o quão deve ser complicado, e te admiro muito por ter seguido isso e se mobilizado para compartilhar sua experiência.
    Sucesso, Olívia, sempre <3
    Beijos e até mais,

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    1. Você é muito amor <3 E sua história, apesar das partes ruins, é muito legal! Que bom que voc~e conseguiu se livrar dessas condições que nossa sociedade nos impõe!

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  5. Fico muito feliz que você tenha feito este post. Eu nunca aceitei meu cabelo e só agora nesse ano que estou aceitando. Meu cabelo é cacheado e desde pequena eu passei produtos químicos. Fico feliz que eu não sou a única a ter passado pelo processo de auto aceitação. Muito obrigada!!!

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  6. Fico muito feliz que você tenha feito este post. Eu nunca aceitei meu cabelo e só agora nesse ano que estou aceitando. Meu cabelo é cacheado e desde pequena eu passei produtos químicos. Fico feliz que eu não sou a única a ter passado pelo processo de auto aceitação. Muito obrigada!!!

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    1. Oi Dyulie, tudo bem?

      Que bom que gostou do post e que bom que você conseguiu aceitar a beleza do seu cabelo <3

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  7. Olivs, tô aqui num orgulho que não cabe no peito... virou sorriso!

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