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Jonathan Strange & Mr. Norrell, de Susanna Clarke

13.7.15Eduardo Ferreira

O lugar é a Inglaterra, o ano é 1808. Guerras Napoleônicas acontecendo e uma sociedade com conhecimento de que a magia existe, mas é impraticável. Uma magia que é mais tratada como ciência, com diversos estudiosos que se autointitulam magos da Sociedade Culta dos Magos de York, mas que nunca conjuraram feitiço algum. Isso até Gilbert Norrell aparecer e provar que é o único verdadeiro mago da Inglaterra.


Norrell é um excêntrico e recluso senhor de York. Detento da maior biblioteca de livros de magia da Inglaterra, ele chama a atenção da Sociedade Culta do Magos e é convidado a para provar que consegue realmente conjurar feitiços. Após o incrível feito de incitar todas as estátuas de uma igreja a criarem vida e saírem andando pela cidade, Norrell é apresentado a um desafio maior: conjurar um feitiço gigantesco e ressuscitar uma importante senhorita da sociedade, decisão que faz todo o plot do livro girar em torno de suas consequências.

Norrell consegue, então, mostrar para a sociedade que ele é o último Mago da Inglaterra. Mas, essa soberania não dura tanto. Após conseguir mostrar que magos ainda existem, Norrell descobre Jonathan Strange, um jovem adulto que também consegue conjurar feitiços. Norrell é convencido a tomar Strange como seu discípulo e ensiná-lo tudo sobre magia.

Porém, Strange e Norrell são dois extremos. O primeiro querendo sempre aprender mais e usando a magia para resolver tudo, o segundo querendo proteger a magia a todo custo. E essa forma de cada um lidar com a magia tem muito a ver com a personalidade de cada um. Norrell é egoísta e, por se achar o maior mago da Inglaterra, por vezes é arrogante e tenta privar Strange de conhecimentos mais profundos de magia. Em parte porque ele entende as consequências de se praticar, mas principalmente porque ele quer continuar sendo o maior mago contemporâneo.

"Quero dizer que dois de qualquer coisa é um número assaz incômodo. Um faz o que bem entende. Seis podem se dar perfeitamente bem. Mas dois acabam sempre lutando pela supremacia. Dois vigiam sempre um ao outro."

Enquanto a história de Norrell é focada em restabelecer a magia na Inglaterra não só como sendo algo possível, mas também comum, a de Strange é focada em ajudar a Europa a vencer a Guerra contra a Espanha usando da Magia para tal feito.

Em Jonathan Strange & Mr. Norrell, além da história, o que chama atenção é a forma como é contada, a personalidade forte dos personagens e, acima de tudo, o bom humor durante toda a narrativa. Narrativa essa que, por vezes, se torna a personagem principal da história.

Um ponto positivo sobre o livro é que ele se passar no período de uma década, o que é muito bom porque a maioria dos livros que lemos hoje em dia se passa num curto período de tempo. Esses 10 anos abrem um espaço maior para que várias coisas aconteçam (como consequências de ações do passado) e nos mostram o desenvolvimento desses personagens durante todo esse tempo. Assim, aquela ideia de um Norrell mesquinho e arrogante e de um Strange bonzinho que quer ajudar se torna algo muito além disso.

A autora usa e abusa das notas de rodapé para contar histórias paralelas e relevantes ao contexto, e isso é uma das coisas mais interessantes sobre esse livro. A riqueza dos detalhes e o cuidado dela em contar essas histórias sobre o mundo só acrescentam ao enredo e tornam o livro ainda mais incrível.

Jonathan Strange & Mr. Norrell traduz muito bem a sociedade da época. A mulher como ser inferior (não podendo fazer magia), a falta de empatia com os outros por simples diferença de classe social ou raça. E o livro se mostra ser não só uma crítica à sociedade da época, como também à nossa.

É sobre uma sociedade que sabe da existência da magia, mas que não consegue praticá-la por acreditar que não existam mais magos. É sobre uma sociedade que finalmente percebeu que aquilo que eles sabiam a vida toda existir está agora se tornando algo cada vez mais comum. É sobre uma sociedade que está tentando se acostumar com o novo normal. E que diferença tem essa sociedade da nossa atual?

O livro é dividido em três volumes e é interessante ver como o tom da narrativa muda com a mudança dos focos narrativos. O primeiro volume, que é focado em Mr. Norrell, apresenta uma narrativa mais descontraída e cômica, enquanto o segundo, focado em Mr. Strange, já apresenta-se mais séria e focada.

Mas, apesar de todos esses detalhes, o que que mais me impressionou na história é que a autora apresenta personagens que você pensa que estão ali só pra mover a história dos principais, que não são tão importantes, e que com o passar das páginas se mostram tão essenciais quantos os protagonistas. E ela faz isso de forma tão natural e dinâmica que você fica tentando lembrar quando é que tal personagem passou a ser tão relevante pra trama.

O livro é gigantesco, e a história é incrivelmente cheia de detalhes que te fazem entrar nesse mundo mágico de tal forma que é impossível não se apaixonar.

Eu sinto que falei tanto sobre a história e, mesmo assim, deixei muita coisa de fora. Só agora percebo que isso é por causa da riqueza de detalhes e pela quantidade de coisas importantes acontecendo em um mesmo livro. Jonathan Strange & Mr. Norrell é a opção perfeita para te transportar a uma época fantástica, por vezes sombria, mas ainda assim incrível.

Jonathan Strange & Mr. Norrel foi adaptado para a TV pelo canal BBC e em breve farei uma análise da série comparando com o livro.

Livro: Jonathan Strange & Mr. Norrell
Autora: Susanna Clarke
Tradutor: José Antonio Arantes
Editora: Seguinte
Páginas: 824
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(4,5/5 conversinhas)



Este livro foi cedido pela Companhia das Letras (sob o selo Seguinte). Muito Obrigado *-*

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2 comentários

  1. Olás! o/ Acredita que eu abandonei esse livro? Nem porque achei tão ruim, mas eu comecei a ler e acho que tive um bloqueio de leitor (hahaha, amei o termo?) e passei tantos dias com ele parado, que acabei desistindo. Seu post quase me fez querer tentar de novo. Se eu ainda tivesse o livro, provavelmente tentaria (acabei passando pra frente). Acho que vou dar uma chance pra série e, caso goste, posso conseguir o livro novamente. :)

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    1. Andrea, é realmente um livro meio difícil de ler. Tem muitos detalhes e é muito fácil se distrair e se perder na história. Eu demorei DOIS meses pra terminar ele. Grande parte por causa da faculdade, mas ele realmente é "denso". Comecei a ver a série esses dias e tô gostando muito da adaptação. Muito parecida com o livro. Acho que vale a pena dar sim uma segunda chance =)

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