CCSociedade Dana Martins

Pensamentos sobre representatividade

31.5.15Dana Martins


Uma coisa que eu acho divertida é como às vezes assuntos que parecem aleatórios estão relacionados. Aí essa semana eu comentei com a equipe do CC: eu sinto que tem alguma ligação aqui. Mulheres sendo estupradas em Game of Thrones, o pênis de ouro, mulheres como objetos (Mad Max) e representatividade. Além disso, o quote que coloquei lá embaixo do layout é basicamente o resumo da importância da representatividade.

“As garotas precisam de modelos, só assim podem imaginar-se em qualquer carreira. Você não pode ser o que não pode ver. ” - Sally Ride - reblog

Mas o que isso tudo tem a ver?

A resposta da Bells pra o que eu disse foi:

"A ligação: homens em geral são criados para super valorizar seu precioso membro e ser machão, daí surgem todas as merdas."

Eu não colocaria exatamente assim, mas acho que isso resume bastante. HUAHUAH O que isso me fez pensar é que é tudo uma questão de representatividade - ou a falta dela. Essa semana eu escrevi um texto chamado "Quem você vê quando assiste filmes?", que compara ser representado com se ver no espelho. Só que eu mostro como a imagem na frente do espelho pode ser bem imparcial e é esse o ponto de convergência desses temas. 

Nós precisamos de representatividade porque todos nós existimos, mas só alguns são vistos.

O texto do Eduardo sobre Game of Thrones, analisando o uso de estupro na história, vem de uma discussão já antiga sobre a forma como abuso sexual é retratado na série. "Mas é realista!" alguns dizem. Será mesmo que é isso?

Será que não há algo mais por trás do fato de que quase todas as mulheres principais da série já foram estupradas?

Aí caímos no pênis de ouro, ou de um milhão de dólares, que é o texto da Elilyan sobre nu frontal dessa semana, que é um exemplo da diferença como mulheres e homens são retratados (ou seja, de uma forma nada realista e imparcial). 

"A questão é que o fato de não lidarmos adequadamente com a visão desnuda do corpo masculino, mas em contrapartida termos uma super exposição feminina, diz muito sobre a nossa sociedade." - Elilyan 

Em Game of Thrones mesmo, eu até tive dificuldade pra lembrar se teve algum pênis sendo mostrado e a Elilyan me ajudou a encontrar 2 (Theon e Hodor), enquanto já vi trilhões de mulheres peladas. Até aquela cena ridícula da pessoa de cabeça pra baixo com a perna aberta se oferecendo pra o homem. Eu não tenho nem certeza se era mesmo uma pessoa ou uma vagina com vida própria.

Sem querer procurando a imagem abaixo encontrei isso. Faz parte de um post sobre o tema que eu ainda não li.


Oberyn  (amarelo) com o prostituto. Depois de contratar os serviços dele, vemos uma cena na cama com os dois, Elia Sand e outras prostitutas. 
Aliás, taí um bom ponto do realismo. Como diabos a gente tem tanta mulher prostituta de fundo, mas só tem um homem e não só ele é homossexual, como tem um papel relevante na história? Aliás, na cena em que ele aparece com o Oberyn a série já retratou ele sendo muito mais "dono de si" do que qualquer outra mulher. Ele rejeita o Oberyn, ele protesta, ele diz "Eu sou muito caro!" e só quando o Oberyn usa seu ~charme de príncipe~, o prostituto pensa melhor. Ainda na cama, ele parece ter decisão do que quer fazer ou não, quando rejeita a Elia, que tá na cama com eles. 

Não que isso não seja realista. Até hoje homem vale mais do que mulher. Mas é em grande parte causa dessas representações problemáticas que nos ensinam isso. 

Comparação de salário nos EUA. Mulheres negras e latinas recebem ainda menos. fonte



Agora é que entra Mad Max: Estrada da Fúria. Minha resenha-comentário do filme saiu essa semana e nela eu falo sobre como é uma história sobre feminismo. Um grupo de mulheres que vivem nessa sociedade machista ao extremo decide fugir porque não são objetos sexuais. É basicamente isso. NÓS NÃO SOMOS PROPRIEDADE. NÓS NÃO SOMOS COISAS. O filme mais do que uma tentativa de equilibrar as imagens na frente do espelho da representatividade, é sobre uma luta contra a falta de espaço na frente do espelho.

E é interessante que (spoiler de Mad Max) no início elas tentam buscar um novo espelho, mas percebem que talvez a solução seja voltar e dividir o espaço de modo que todo mundo possa se ver no espelho. O que é basicamente o feminismo. (fim do spoiler de Mad Max)

Em breve o Paulo vai postar a capa do resumo da semana no facebook com todos os últimos textos. Lembre de curtir e compartilhar. :)

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Em maio o tema de ordem no CC foi "representatividade", em que buscamos escrever textos discutindo a nossa relação com personagens fictícios. (apesar de que se tem algo que eu aprendi fazendo as capas do resumo da semana, é que "representatividade" é um tema constante no ConversaCult) (e que "representatividade" é uma palavra imensa que nunca cabe em lugar nenhum) E eu me divirto vendo que quando nós focamos em um assunto, ele acaba se construindo ao nosso redor mesmo sem a intenção. Nenhum desses textos citados fazem parte do CCSexta em si, mas todos eles ajudam a construir a conversa.

No caso, todos eles são partes de uma discussão mais complexa sobre a falta de representação (ou desequilíbrio). Mulheres sendo estupradas, pênis sendo tratados como o Santo Graal, mulheres lutando para não serem estupradas e uma reflexão sobre querer se ver no espelho também.

No ccsexta em si, a conversa foi um pouco mais diferente. Eu abri o mês falando dos personagens que reforçam partes de mim. E aparentemente eu fui a única que tive problemas porque eu me reconhecia demais em muitos personagens. Não é nem que eu, como um todo, me sinta tão representada. Há muitas coisas que poderiam ter - garotas gordas, introversão ou o fato de que você não precisa ser nem "a pessoa séria sinistra" ou a "bolinha de energia saltitante". Eu posso ser os dois??? É, acho que a Korra é uma das pessoas que mais me representa. 


Já a Bells sofria do contrário: falta de identificação. O texto dela fez muito sucesso, na verdade. Foi uma surpresa ver que muitas pessoas também não se enxergam nas histórias que estão vendo e queriam algo mais. *torcendo pra Bells escrever as próprias histórias com alguém que a represente*

A super-Elilyan e a Adriana dividiram o espaço, o que eu achei muito bonitinho, e mostraram que gostam de personagens com "defeitos". Personagens que trazem aquelas características que não são muito valorizadas ou que simplesmente não têm a índole de uma super-heroína de bom coração. Elas gostam daqueles personagens humanos. Sabe, como todos nós. 

"Já a magia da representatividade faz a pessoa ver a si mesma e perceber que pode existir." eu mesma, no texto do espelho da representatividade

O Diego nos deu de presente esse tema. Apesar de que eu ainda espero o texto dele. Certeza que ia zerar o tema de vez.

E, por último, o Paulo, que veio com um texto que eu gostei muito, porque enlaça os dois tipos de representatividade. Ele fala que sempre buscou personagens gays, mas mudou de perspectiva e pensou em personagens que mostravam partes dele, que é o que a gente veio fazendo nesse mês. De quebra, ainda encerra com uma proposta: "pense em quem te representa na ficção, é como uma jornada de autoconhecimento." 

E é. E faz mágicas. Se ver faz mágicas. Ainda mais quando o que você vê é >realmente< realista e te ensina a ser mais confortável com si mesmo.

Fica aqui um trecho do texto da Evanna Lynch, atriz que interpretou a Luna Lovegood em Harry Potter, que eu estou traduzindo:

"O amor (love) da Luna Lovegood é um tipo BOM (good) de amor. Não é condicional ou possessivo ou necessitado ou exigente. Não desaparece no momento que você expõe uma parte de você que não é convencional ou até inapropriada. Luna é um personagem que aceita todas as pessoas e criaturas de todas as formas, as ama exatamente por quem elas são e é alguém que constantemente admira a diversidade, estranheza e novidade de cada ser que ela encontra. Você já se perguntou por que ela encara abertamente, sem piscar e por desconfortáveis períodos de tempo as pessoas? É porque ela literalmente está se apaixonando por uma sarda de forma estranha no nariz da pessoa, o modo excêntrico que ela pronuncia "perguntou", por aquela coisinha estranha incontível que ela não pode esconder por muito tempo embaixo de um olhar tão amorosamente dedicado. E por último o único modo que Luna pode ser quintessencialmente Luna é porque ela ama e aceita a si mesma completamente. Se Luna fosse condenar e vilanizar uma coisa tão intrinsecamente humana quanto a nossa sexualidade e ver QUALQUER forma disso como errado ela não seria tão confortável com si mesma e ela não seria quem nós conhecemos e amamos." 



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Espero que você tenha gostado desse texto, que eu não sei de onde surgiu ou o que significa, mas que eu quis fazer mesmo assim. Aqui no CC mais do que posts aleatórios, a gente traz muita coisa que ajuda a construir uma conversa. Já reparou nisso? Eu espero que repare, porque é legal.

Outra coisa que eu reparei é como textos na internet parecem destacados da nossa realidade. Você pega, absorve e tchau. Então espero que isso aqui seja tipo uma sacudidazinha do tipo "Wow! Esses textos estão falando comigo. Sobre a minha vida. Sobre o mundo. Eu posso ter uma opinião. Eu posso usar isso. Eu posso pegar esses temas e transformar em algo mais." Porque é, é assim que eu uso o CC. Essas conversas me ajudam a repensar como eu lido com o mundo e eu aprendo muita coisa. Espero que você aproveite também essa experiência.



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