A Menina que Tinha Dons
CCLivros
A Menina que Tinha Dons nos traz pós-apocalipse e representatividade
7.3.15Dana Martins
Ler A Menina que Tinha Dons foi... uma surpresa. Talvez até a última página. Surpresa porque a história foi tudo o que eu não pensava que seria.
Pra começo de conversa, eu conheci o livro em um email da Rocco falando de lançamentos, já de cara fiquei com vontade de ler porque: capa legal. Quando pesquisei mais vi que o autor M.R. Carey era roteirista de X-Men e isso parecia bom sinal. Agora o que eu imaginava sobre a história? Primeiro jovens com superpoderes, depois eu li algo que me fez pensar que eram crianças com poderes especiais que viviam isoladas do mundo e... a vontade desabou. Não sei nem por que, mas comecei o livro cheia de preconceito.
"O nome dela é Melanie. Significa "a menina escura", de uma palavra em grego antigo, mas sua pele na realidade é muito clara, então ela acha que talvez este não seja um bom nome." (primeiras palavras do livro)
O livro começa já afirmando que a protagonista é branca e... não tava com paciência. Tava pensando coisas como "to lendo só por causa da parceria". De onde eu tirei toda essa má vontade? Não sei. Só sei que isso mudou rapidinho. Logo de cara a voz de Melanie se tornou extremamente marcante. O livro não é narrado em primeira pessoa (ela falando de si), mas captura a forma como a garotinha vê o mundo. E não é um mundo bonito.
Imagine uma menina de 10 anos que vive em uma cela, só sai quando é para estudar e amarrada em uma cadeira até o pescoço cercada de guardas. Eu achei muito legal como o autor mostra isso, porque ele mostra um ambiente que você, leitor, com certeza sabe que é problemático e opressivo, mas ela não sabe. Aquilo é tudo o que ela conhece. Ela é uma criança. Essa é a vida dela. O contraste do mundo visto pelo olhar doce de Melanie é muito bom.
Ainda mais que as dúvidas começam a se juntar. Por que ela está ali? E o que vai acontecer? Porque é óbvio que vai acontecer algo, a garota não vai ficar sendo carregada pra cá e pra lá o livro inteiro sem o direito de falar. Certo?
Citações no verso da capa de pessoas que nunca leram um livro pós-apocalíptico na vida |
Nós também somos apresentados a outros personagens. A Srta. Justineau, que é a professora preferida de Melanie (e ela é negra). Depois a Dra. Caldwell, que só aparece às vezes para ver as crianças. Foi aí que eu me dei conta de que já tinha avançado bastante no livro e que a narração só tinha seguido o ponto de vista de três mulheres. Isso não durou muito tempo, porque logo depois conhecemos um militar. Mas de uma forma ou de outra, isso já era algo grande. Eu não duvido muito que em uma história qualquer a Dra. Caldwell fosse um Dr. Caldwell.
Discutindo com o próprio cérebro: É engraçado que a minha noção de "qualquer" seja de homens. Uma história normal = só com homens. Não é que histórias normais sejam só com homens, é que a maioria seja só com homens.
E, sim, eu to falando de representatividade (como o Paulo disse: porque no ConversaCult a gente faz isso), mas também porque é um livro que se importa com representatividade.
Eu fui até pesquisar sobre a Rosalind Franklin, pra ter certeza de que não era o autor inventando nome, e ela foi uma biofísica britânica que ajudou nas pesquisas do DNA e o Google é cheio de links falando sobre ela não ter recebido os créditos. Com uma simples citação, A Menina que Tinha Dons fez Rosalind Franklin existir e validou seus créditos pela descoberta. É assim que a gente reescreve história para algo mais próximo da realidade.
Ao longo do livro, o autor também faz questão de mostrar que as mulheres são independentes e não precisam dos homens que as acompanham, o que é bem legal. Depois eu quero comentar sobre representatividade nesse livro em outro post, mas não hoje.
A maior surpresa lendo A Menina que Tinha Dons foi descobrir que é uma história pós-apocalíptica. Sim, o bom e velho pós-apocalipse de sobrevivência em uma jornada por cidades destruídas. O diferencial, além da representatividade, é a própria Melanie. Lembre que ela ainda é "a menina que tinha dons" e isso está intrinsecamente ligado com toda a mitologia de fim de mundo desse livro.
O livro, de certo modo, me lembrava a The Last of Us em alguns momentos. Algumas semelhanças na narrativa (pós-apocalipse, afinal), mas mais no clima de mundo devastado meio rural e sobreviventes unidos lutando para não morrer.
Se a Ellie fosse loira e mais nova essa poderia ser uma cena de A Menina que Tinha Dons |
Eu adoro histórias de sobrevivência e A Menina que Tinha Dons não poderia ficar de fora. Não vou dizer que é a minha preferida, mas é realmente muito boa e traz novidades para esse tipo de história. Aliás, também me lembrou bastante do livro A Passagem, do Justin Cronin. Talvez A Menina que Tinha Dons é uma versão resumida e menos sobrenatural desse? Tanto faz, gosto dos dois.
Ou seja: nada de jovens com superpoderes. Nada de crianças presas num mundo distópico. No fim do dia, A Menina que Tinha Dons é o melhor do pós-apocalipse.
-dana martins
Em breve também quero falar aqui de uma série CHEIA DE SOBREVIVÊNCIA MARAVILHOSA QUE EU TO ASSISTINDO AGORA (E NEM TO ANIMADA)
Livro: A Menina que Não Tinha Dons
Título original: The Girl With All The Gifts
Autora: M. R. Carey
Editora: Fábrica 231 (selo da Rocco)
Paginas: 381
Sobre a nota: Ia dar 4,5, mas leva 5 pela representatividade
Nota:
(5 conversinhas - nota máxima!)
obrigada à Rocco (e Fábrica 231) pela chance de ler o livro :) |
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1 comentários
Olá Conversa Cult! Comecei a acompanhar o site a um tempinho mas, só agora estou comentando *vergonha*, e venho expor que adoro o conteúdo daqui. As resenhas e o modo que são escritas me deixam muito instigada e me levam a realmente questionar.O que é ótimo, além dos outros assuntos tratados; como por exemplo, a representatividade que foi dialogada com a história do livro.Adorei. Enfim, adorei a resenha! Bjs.
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