"Não é engraçado como o medo torna as pessoas apaixonadas?"
E aí, lembram do F. Scott
Fitzgerald, autor de Este Lado do Paraíso e O Grande Gatsby? Hoje, eu NÃO venho
falar dele. Aliás, começar esse texto citando sua obra já é uma ofensa a autora
que vim resenhar, que é sua esposa. Afinal, por trás de todo o grande homem há uma grande mulher.
E no caso de Zelda, uma grande mulher com um histórico polêmico e acusações de
loucura. Com um romance inteligente e ácido; uma ficção empapada de realidade,
a Senhora Fitzgerald nos traz uma obra sobre a condição feminina na década de
trinta e tenta fugir da sombra que o marido lhe impôs e impõe até hoje
(inclusive neste parágrafo).
Quer saber se ela foi bem
sucedida na tarefa?
Minha curiosidade pela vida de Zelda Fitzgerald demanda uma breve contextualização: me apaixonei pela “geração perdida” de artistas e autores que viviam boêmios na França da década de trinta através do livro autobiográfico de Hemingway, “Paris é uma Festa”. Nele, o autor demonstra indiscreta rixa com duas damas, a poetisa lésbica, Gertrude Stein e a esposa de seu grande amigo, Francis Scott Fitzgerald - a quem ele julga ter um potencial imenso que é constantemente minado pela mulher. Mas Hemingway não era nenhum santo e sabemos que suas qualidades incluem “homofóbico” e “machista”, o que torna sua versão dos fatos duvidosa. Foi por isso que eu cheguei a este livro, que leio para poder tirar minhas próprias conclusões sobre ela.
ninguém me entende... |
“Esta Valsa é Minha” é o único romance de Zelda Fitzgerald, escrito nas primeiras semanas de sua internação em um manicômio. O local onde foi escrito é determinante para a obra, pois seu propósito é revelar seu lado da história, que sempre foi ignorado. Assim como seu marido fez anos antes com “Suave é a Noite”, ela traz uma narrativa quase autobiográfica (o que leva muitos a tratarem as obras como romances complementares), e eu não tive como ignorar isso durante a leitura. Seu livro é, no mínimo, intenso. Sua escrita é elaborada e carregada de metáforas. Tão inteligente quanto o marido, que visivelmente lhe influenciou. Ainda assim, falta-lhe a simplicidade nas frases, que ás vezes exigem muita reflexão para serem lidas (o que tornou o processo um tanto difícil em alguns pontos). É uma obra de digestão lenta e isso deve ser respeitado.
Na história, seu alter ego, Alabama, é uma jovem que se apaixona pelo artista David Knight. Os dois tem uma filha juntos e se mudam para Paris visando os melhores interesses do homem e sua produção artística. E aí que a coisa começa a ficar interessante. Entediada com a viva social parisiense e cansada do anonimato acarretado pela fama do marido, Alabama sente a necessidade de escapar das trevas da vida de dona de casa e se dedicar a um propósito maior. Ela deixa a filha em casa e decide praticar ballet, mesmo tendo a muito passado da idade para ser bem sucedida neste ramo – atitude profundamente criticada. Seu relato é emocionante, pois retrata a luta de uma mulher que descobre o sabor da ambição em um mundo que nada espera dela, a não ser a criação dos filhos. A valsa é dela, e é preciso muita coragem para dança-la, pois Alabama tem de dança-la sozinha.
"- O problema com emergências - disse ela. - É que sempre visto minha roupa de baixo mais fina e então nada acontece."
Não digo que seja um livro fácil de ler, tanto pela sua forma quanto pelos seus temas. A noção de que aquilo tudo de fato aconteceu estava sempre martelando minha cabeça. O drama de Alabama me deu uma nova perspectiva sobre o casal Fitzgerald e um respeito muito maior por Zelda, rechaçada por uma sociedade que não estava pronta para dar independência às mulheres. Mesmo em desgraça, ela sustentou um humor afiado e não se deixou intimidar. O livro foi seu último grande ato e ela se despediu com elegância.. Zelda foi outra vítima na história da nossa sociedade machista. Não acho que ela foi santa, mas tampouco a vejo como a diaba que Hemingway descrevia. Talvez um meio termo, talvez em meia luz, como tantos de nós.
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(3.5 Conversinhas)
Esta resenha só foi possível por que a Companhia das Letras é uma editora linda e nos enviou um exemplar (diga-se de passagem, uma edição maravilhosa e cheia de prefácios). Um beijo pra você, Cia.!
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2 comentários
Não sabia que ela havia publicado um romance! Meu último livro foi Este Lado do Paraíso, e vou ler agora O Grande Gatsby. Fiquei muito interessada em ler ess livro dela (:
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indiquei esse post nos meus links da semana (:
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