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A narrativa do vômito

9.8.14Igraínne


Hoje trago um texto diferente dos demais publicados no ConversaCult. Eu, Igra, venho tentando transferir contos e crônicas artísticas para o blog porque sinto que, além de o CC não ter tido, até então, nada assim desde que foi criado, eu absorvi certa necessidade de exposição. Talvez isso seja vaidade, embora eu prefira apenas pensar que é um grito surdo (sdds Clarice) do tumblr. O (meu) tumblr tem ficado pequeno para o que eu reflito e desejo contar ao mundo. Então decidi trazer alguns murmúrios íntimos para cá.

Eu pensei muito no que escrever a princípio, considerei diversos trechos de histórias que poderia colocar aqui, pensei em seguir um padrão adotado por blogueiras em geral, uma vez que a maioria se atém a contos voltados à vida amorosa... Mas, por fim, cheguei à conclusão de que eu sou um pouquinho diferente. Minhas crônicas (e contos) não serão (só) sobre isso. Na verdade acho que a minoria abordará esse tema.

Mas isso você já vai perceber.
Curioso? Vá em frente.


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Essa coisa de fazer faculdade pode ser estressante. Dia desses eu estava de mau humor. E dá pra ganhar dinheiro assim, só tendo mau humor. Tenho professores que o fazem. Esbravejam com seus braços em movimento, proferindo ameaças diretas e pouco implícitas como "o trabalho deve ter no mínimo 5 laudas! Prova final é semana que vem! Querido, desligue o ventilador, isso aí me incomoda. Você!, você aí, favor ler em voz alta esse parágrafo!"

Ordens, ordens e ordens. Sentada na minha cadeira, procuro não menosprezar o fato de que o decreto do número mínimo de páginas é, por si só, um tipo de máxima. Tenho uma amiga que escreve coisas incríveis. E o poder de síntese dela é invejável. Embora isso jamais importe, é claro.

Nesse mesmo dia do mau humor, e pouco antes dessa mesma aula, por acaso ou não, eu havia dado de cara com um post no facebook escrito por um desses conhecidos intelectuais que habitam instituições de ensino mundo afora. E eu nem mesmo falo dos pseudo-intelectuais, falo dos que refletem tão maravilhosamente bem sobre coisas ínfimas do dia a dia. Na postagem em si, esse conhecido dissertava de maneira bem convincente sobre como o Google é na verdade um limitador de pensamento, uma vez que a ferramenta (ferramenta?) tenta supor, a todo momento, com sua pergunta arrogante (debochada?), o que supostamente queremos dizer com determinada expressão. "Você quis dizer...".

A postagem em si, com um número considerável de curtidas, me fez pensar no quanto essas arrogâncias e delimitações de pensamento são absolutamente frequentes no mundo atual. Surpreendi-me divagando a respeito das transposições dos jornais midiáticos, que colocam em destaque o que julgam ser de maior importância para a população - ou seria para eles? É um controle inevitável, embora, na verdade, toda a discussão tenha me feito pensar em poder. Talvez seja porque eu possua certo fascínio por esse tipo de assunto, talvez não, mas toda essa história, desde professores arrogantes em posição infeliz até o Google presunçoso, tudo isso me levou à terrível conclusão de que, na realidade, a informação, no mundo todo, é simplesmente comercializada sob alto preço - o preço mais alto de todos. E isso nem é metáfora.

O problema não para por aí: ninguém está exatamente preocupado em sequer deixar esse comércio escondido. É bem escancarado. 

Colégios, faculdades, assinaturas de televisão à cabo, jornais e revistas... Tudo isso é "pagável". Sobre a Tv aberta, bom, isso já são outros 500, uma vez que ninguém ali está perguntando a você sobre o tipo de informação que você gostaria de ter acesso. Edita-se o editável, dá pra fazer tese sobre isso. E, mesmo que você, caro leitor, tivesse a chance de opinar sobre o que iria ao ar ou não, seria garantido que, assim como o Google, o resultado esperado comandaria seu pensamento: "Você não quis dizer *?".

Não há sinais que indicam fins de aula em universidades, mas assim que os professores presunçosos cessam seu destemido arranjo de infelicidade em discursos disfarçados de conhecimento, eu me levanto. Pego minha bolsa, arrasto-me para fora. Ainda sinto mau humor e minha cabeça agora dói.

- Gente ignorante é sempre mais feliz, você não acha? - ouço de alguma conversa do corredor.
Eu rio apenas uma vez, porque parece ser a constatação mais simples e óbvia do mundo. A professora presunçosa da aula anterior não parecia uma mulher feliz. E ela tinha pós-doutorado.

Talvez houvesse, enfim, algum motivo que justificasse sua infelicidade. Ela teria que ler cinco páginas de embromação em muito trabalho que poderia ser excelente em uma página só. Era aquele desejo de mostrar o que nós deveríamos "querer dizer", como tantas vezes eu tinha lido em trabalhos corrigidos anteriormente por professores arrogantes que haviam aparecido antes dela.

Porque não, eu não estava querendo dizer o que eles pensavam que eu estava querendo dizer. Eu só queria dizer aquilo mesmo, o que estava bem ali no papel. 


E você? Tem uma historinha escrita por aí? Conta pra gente!


- Igraínne M. 
(vulgo Igra)

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2 comentários

  1. Olá!

    Eu gosto de crônicas porque, além de ser o gênero que me sinto mais distante de possuir qualquer forma de domínio, penso que é por ela que, de fato, podemos conhecer a verdadeira face de um autor. Sem histórias mirabolantes ou eu-líricos fantasiosamente delineados, é muito mais cômodo e interessante de se absorver as opiniões de alguém.

    E nesta crônica em especial, me identifiquei bastante com a questão do estresse e de como ele afeta o nosso dia a dia.

    Ainda hoje, dentro de um ônibus, ouvi uma mulher gritar para o motorista que ele deveria ter olhado pelo retrovisor e parado o veículo quando ela se levantou, pois não era sua culpa que o sistema de sinalização dos passageiros estivesse defeituoso. Mas, o que não consegui entender é que, apesar dela realmente não ter culpa, qual é a necessidade de subir o tom e faltar com o respeito se a culpa também não é dele? Qual a dificuldade de se usar as chamadas “palavrinhas mágicas”: por favor e obrigado?

    Às vezes, quando vejo as pessoas reclamarem de coisas sem solução justamente por não terem solução, tento encontrar um ponto de vista onde isso faça sentido e não consigo. Afinal, se não é solucionável, reclamar não vai ajudar, vai?

    É difícil entender os motivos pelos quais as pessoas não sorriem mais vezes, ou pelo menos não tentam fazê-lo.

    Bem ou mal humorado, sua segunda-feira ainda será sua segunda-feira, assim como todo o resto de sua rotina. Seu humor não mudará nada naquilo que você faz. Exceto, é claro, a sua excelência, bem-estar e educação interpessoal.

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    Respostas
    1. Oi, Luan!

      Fico muito feliz por ter gostado da crônica. Mais feliz ainda eu fiquei ao perceber que escreveu a sua própria - muito boa, por sinal.

      É realmente incrível como as coisas simples são as que mais nos geram material para esse tipo de narrativa, não é mesmo? O dia a dia está cheio de situações como essas, que nos fazem refletir e questionar, um acaso que provoca choque e observação de sobra. Acho que as pessoas deveriam parar de simplesmente culpar uns aos outros, é um tanto quanto cansativo até.

      Beijão!

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