a culpa é das estrelas CCAnálise

O que A Culpa é das Estrelas nos mostra sobre a importância da ficção

25.6.14Unknown


“A Culpa é das Estrelas” está nos cinemas e resolvi reler o livro para ter todos os sentimentos outra vez - e não é que acabei percebendo coisas novas? Já fiz duas resenhas do livro anteriormente (confira aqui e aqui), e dessa vez volto para fazer uma análise. Sempre pensei que eu e a Hazel pertencêssemos a mundos completamente diferentes, mas não é bem assim. Temos uma relação muito similar com a ficção, continue lendo o post para saber o por quê. 

Quando eu falava meu “ranking” dos livros do John Green*, nunca colocava “A culpa é das estrelas” no primeiro lugar. Meu discurso costumava ser que, sim, esse é o melhor que o Green escreveu, entretanto, também é o que eu menos me identifico com os personagens. Na expectativa da estreia do filme, reli o livro e percebi o quanto eu estava errado. Não sofro de uma doença terminal nem nada do tipo, mas essa característica não define os personagens. Isso é meio óbvio e eu sempre defendi que o câncer não era o principal nessa história, mas parece que uma nuvem  foi implantada ao redor da minha cabeça e impediu que eu percebesse as nossas semelhanças.
*aos interessados, a ordem era (é?): “O Teorema Katherine”, “Cidades de papel”, “ACEDE” e “Quem é você, Alasca?”

Uma coisa que eu sempre busco quando estou lendo ou assistindo algo é a identificação. Aprecio obras pela sua qualidade, claro, porém é diferente quando eu consigo me ver no lugar daqueles personagens. A sensação de que aquela poderia ser a minha história dá um ar especial à ficção. Não procuro personagens exatamente iguais a mim, mas quanto mais próximos são os nossos sentimentos e as nossas características, mais significativos se tornam os livros e os filmes. E a Hazel também é assim.


"Esses livros deram a Matilda uma mensagem de esperança e conforto: você não está sozinha."

Só agora, na terceira (ou quarta?) vez que leio o livro, é que fui me dar conta do tamanho da importância da relação da Hazel com “Uma aflição imperial”. Mais do que a história de amor entre a Hazel e o Augustus, temos a história de uma menina que era extremamente apaixonada por um livro. E essa paixão não vinha somente da qualidade do romance, mas especialmente da identicação da menina com a história. A Hazel e a Anna, personagem do livro escrito pelo fictício Peter Van Houten, podem estar em contextos diferentes, mas as duas são adolescentes vivendo com uma doença terminal. 

Esse não é um tema tão comum nos livros, pelo menos não retratado de forma tão fiel. Nas palavras da própria Hazel, “Peter Van Houten era a única pessoa que eu conhecia que parecia: (a) entender o que era estar morrendo, e (b) não ter morrido”. O amor da Hazel pelo livro é tão intenso porque ela nunca tinha visto uma representação tão próxima da sua vida quanto a Anna. É por isso também que ela se importa tanto em saber o que acontece com os outros personagens depois que a Anna morre e o livro acaba. Uma das maiores angústias da Hazel é o que vai acontecer com a vida dos seus pais após a sua própria morte e isso se reflete na busca pela continuação do livro. Saber que a mãe da Anna segue um bom caminho depois que a filha morre seria uma das únicas coisas que confortaria a Hazel a respeito do destino das pessoas que ela ama.

 
"Gus, eu sou uma granada. Um dia eu vou explodir e vou destruir tudo ao detonar. Eu não sei, eu sinto como se fosse a minha responsabilidade minimizar as perdas."

A partir desse aspecto de “A culpa é das estrelas”, percebi que era possível fazer um paralelo entre a Hazel se enxergando profundamente em uma personagem com câncer e a importância da representatividade para jovens (e por que não adultos?) LGBT+. A diversidade na ficção é necessária no geral, mas pensei especificamente em personagens não heterossexuais e/ou cisgênero por estar mais familiarizado. Não estou comparando a sexualidade e a identidade de gênero de alguém com uma doença, mas ambas são aspectos importantes na vida das pessoas. Tanto pessoas com câncer quanto pessoas queer são consideradas “fora do padrão”, e é aí que a ficção entra. 

Não posso falar por pacientes terminais, mas um dos sentimentos mais comuns em jovens queer é a inadequação. A sociedade, quando reconhece a sua existência, não gosta de você. Em alguns casos, podem até te dar alguns direitos e te tratar bem, mas nunca vão te tratar como um uma pessoa normal (de preferência, homem, branco, cis, heterossexual). Conclusão: você não merece viver em sociedade. Mas não é bem assim. Mesmo com as dificuldades, é possível conviver, o problema nunca é você. Existem pessoas que podem te falar isso, mas, às vezes, a melhor forma de aprender sobre a vida e conhecer novas coisas é pela ficção.


A Ellen Page e vários outros famosos também podem influenciar muita gente, mas isso é assunto para outro post. Enquanto isso, já viu nosso especial LGBT+?

Eu não tenho meu “Uma aflição imperial”, mas alguns filmes, livros e séries compartilham esse lugar especial na minha vida. São histórias com que me identifico e que me passam uma sensação de conforto. Nem sempre são consideradas excelentes por críticos, mas o que realmente importante é o que elas significam para mim. Obras de ficção podem dar força. Inspirar. Empoderar. Mostrar que está tudo bem ser quem você é, assim como é possível mudar algo em você que não é tão legal assim. É libertador se sentir representado. 

- paulo v. santana


Leia mais sobre o John Green

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2 comentários

  1. não sei se gosto mais desse post porque ele é ótimo e é bem minha experiência com essa coisa de ter livros que te confortam (e é uma coisa que eu percebi com o tempo também, não foi na primeira vez que li que eu me identifiquei) ou pelo amor por katherines (pobre katherines, sempre rejeitado </3)

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  2. Esse texto <3

    A história com a qual eu mais me identifico é Um Dia. Costumo dizer que é o livro da minha vida, porque todos os dias do livro são aniversários meus. Mas, como se não bastasse essa coincidência, a protagonista é a personagem com a qual mais me identifiquei na vida. E muita gente não gosta do livro, eu sei que ele tende a ser chato, mas, meu deus, pra mim é um livro de ouro. Já reli algumas vezes e o amor só cresce. Realmente, faz toda diferença essa identificação. Ainda mais se for uma identificação que não ocorre com frequência, faz o livro ser 1 e 1 milhão.

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