Falando abertamente: a nossa coluna para conversar com quem já assistiu!
O filme é ruim? Não. O filme é bom? Não. Divergente não se encaixa em nenhuma categoria. A não ser que você conte "histórias que me fazem escrever posts sem parar" como uma categoria. Eu decidi trazer o Falando Abertamente porque uma resenha não bastaria, eu precisava comentar sobre como é legal a abordagem do estupro, ou como apresentam o assassinato e... bem, todas as coisas que você vê abaixo. E aí, vocês gostaram?
Evitei o máximo de spoiler, mas não tem como não citar algumas cenas. Então deixa o Peeta explicar:
E pássaros também, mas isso é só no filme. |
Trilha sonora: Alto?
Esse é um alto pela metade. Eles têm ótimas músicas em mãos, não caíram naquela de "vamos fazer algo instrumental padrão e lançar um cd de marketing" e souberam usar as músicas que tinham: basicamente usaram as partes mais instrumentais da música. É legal que eles usaram as músicas de três formas: Como ambientação, para dar um tom para história e certos ambientes. Então você escuta Woodkid umas 50 vezes durante o filme toda vez que a Tris se mete nos corredores da Audácia, o que fica um pouco chato. Usam a música para dar emoção, obviamente. E às vezes tomam até o cuidado de combinar a letra da música tocada com a situação no momento.
Em alguns casos ele até perdem a mão na hora de encaixar a música. Alguns casos, porque na maioria chega até a arrepiar. No fim é um ponto alto. Os tipos de música deram o clima ótimo para a história.
Em alguns casos ele até perdem a mão na hora de encaixar a música. Alguns casos, porque na maioria chega até a arrepiar. No fim é um ponto alto. Os tipos de música deram o clima ótimo para a história.
Tratamento de estupro: Alto
Aqui conta tanto o estupro quanto a relação abusiva do pai do Quatro. O ponto alto não é nem por tratar o dilema de ter sido estuprada ou espancado pelo pai, é como mostra a reação dos personagens a isso. Temos uma cena em que basicamente tentam estuprar a Tris, ela reage contra o agressor e encontra um público aplaudindo: ela fez exatamente como deveria ter sido. Ela reagiu. E foi parabenizada!
Quantas as histórias nos passam essa mensagem? Decididamente não a novela, que ao mesmo tempo que bota a menina tentando denunciar um estupro 20 anos depois, coloca outra sendo agarrada a força e deixando porque é bom.
Em Divergente quando Tris pede pra parar, ele diz "tudo bem" |
Aliás, não termina aí: Um outro exemplo é que quando Tris é violentada por um amigo. Ele aparece para pedir desculpa, ela reage dizendo para ele nunca mais encostar nela. (e recebe incentivo das pessoas ao redor) Quando Tris vê algo errado, ela reage.
Drama: Baixo
Então... O filme tem lá seus momentos de "oh, eu sou Divergente!", ou frases que claramente foram pensadas para impactar ("Isso não é real!"), mas muitas vezes apenas cai no brega e beira o ridículo.
A batalha final entre Tris e Jeanine representa bem. Em um momento a vilã diz algo como "Eu também estou disposta a morrer lutando pelo que eu acredito." - e isso totalmente se encaixa no filme, até tornando a coisa mais interessante. A vilã não é má em si, ela é alguém que sinceramente acredita que está fazendo o melhor para todos. Já alguns segundos depois, quando a Tris está a um passo de vencer a batalha, voltamos à frase clichê que foi bem utilizada no filme: "Você não tem coragem o bastante! Você não é da Audácia..." ao que a Tris responde com um silêncio, momento pensativo e... "É, eu não sou. Eu sou Divergente." Essa resposta tinha tudo para ser de impacto, mas... naah.
Tudo bem, no filme Tris atira em 500 pessoas até acertar um personagem que a deixa traumatizada. Mas em quantos filmes de ação você vê a pessoa parar e ficar chocada porque matou alguém? (Jogos Vorazes?) E não basta isso, um dos medos do Quatro é matar inocentes. Só que, é claro, ele precisa passar nos testes e a maneira que ele encontra para matar é virando o rosto. Esse é o truque básico de histórias para desumanizar o inimigo: esconde o rosto e deixa de ser gente, então tudo bem matar.
Criação de mundo: Alto
Eu achei incrível como eles criaram visualmente o mundo das páginas. De algum modo, aquele mato ao redor era o que eu imaginava. As imagens de cima pareciam algo tirado de The Last of Us, com a vegetação tomando conta dos prédios. Eu não imaginava a cerca daquele jeito, mas gostei. Também gostei de como eles desenvolveram uma identidade específica para cada facção e lembraram de incorporar elementos da ficção científica em detalhes como as armas e a tatuagem. Tudo ficou atraente e... artificial.
Parte da Abnegação |
Não sei por que só encontrei essa imagem com uma faixa no meio, mas esse troço é a cerca. |
E aquilo ali é uma mensagem sublinar do S da Supergirl |
Repare nos prédios destruídos. |
Eu não acho ruim, mas acho que vai ter gente se entediando com o filme por causa disso. Divergente não é uma história bem polida de início, meio e fim hollywoodiano. Até porque o próprio livro não é. Por mais que o tema seja claramente "Beatrice toma coragem para se descobrir como Tris", isso é misturado quando a tal Tris se descobre uma divergente, o que é considerado proibido na sociedade e por acaso é no instante que um grupo rebelde está lutando para fazer uma revolução. Mas essa subtrama só se desenrola no final do filme. De uma forma ou de outra, nós passamos a maior parte do tempo vendo apenas Tris lutando para fazer parte da Audácia, se provar e se conhecer, o que nos dá a impressão de que é mais lento.
Tudo bem, talvez a Shailene esteja exagerando. |
Pra dar uma ideia, se fosse aquele filme redondinho hollywoodiano, no início quando a Tris descobre que é divergente no teste, a mulher diria pra ela: Isso é perigoso, você precisa se esconder! Só que a Tris é divergente e ela quer desafiar o sistema, então ela provaria sua coragem indo para a Audácia, ao mesmo tempo lutando para esconder sua identidade. O filme lidaria com ela fazendo de tudo para se encaixar e esconder, até que no final isso seria revelado, conflito, e ela decide lutar contra o sistema.
Veja bem, o filme é em parte sobre isso e essas coisas acontecem, mas não desse jeito. A mulher não avisa Tris de que é tão perigoso assim, ela só fica tendo uma noção maior na metade do filme quando encontra sua mãe. E mesmo assim, ela só se dá conta de que está fazendo errado nas simulações quando Quatro a leva para o medo dele e a ensina como alguém da Audácia faria. Na maior parte do tempo, assim como no livro, o foco da Tris é se descobrir e se provar. E no cinema nós não estamos acostumados a lidar com um roteiro que não é tão claro, ou um filme de ação focado em pessoas.
Adaptação: Alto
Por outro lado, o filme ser assim acaba servindo para ser uma adaptação fiel. Eles tiraram, sim, algumas cenas importantes. E detalhes, tipo a Tris ter só 6 medos. O final foi condensado, alguns personagens não foram nem citados, mas... estava tudo lá. Até mesmo os personagens. Quem leu poderia apontar e dizer "é fulano!" - eles até se esforçaram para coloca-los em cena, tipo o Edward ajudando a Christina com a Tris, ou a Molly aparecendo repetidas vezes. A opção número 1 das adaptações ruins é cortar esses personagens para não ter que explicar ou misturar em um só (preciso citar Percy Jackson?).
Talvez no futuro eu faça até uma análise do filme como adaptação, tipo eu fiz com Em Chamas. Mas no momento é interessante comentar que eles privilegiaram passar o que a Tris sentia e a transformação dela.
Divergente termina como se não fosse um filme bom, tecnicamente falando. Não que seja uma coisa caseira horrorosa. Ele só não é um filme muito comum e comete alguns erros. Mas se ainda não ficou claro: eu realmente gostei. E estou ansiosa para assistir novamente. E falar mais e mais sobre ele!
-dana martins
Veja também: Divergente é a cura do cinema?
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