Este texto, como tantos outros, nasceu de uma conversa com a Dana. Estávamos trabalhando em nossos contos quando ela confidenciou que estava frustrada, pois sentia que seus personagens pareciam iguais. Então decidi contar para ela como faço para diferenciar meus personagens. E como isso a ajudou, concluímos que poderia ajudar mais alguém.
Vindo dos meios do RPG, conceitos são algo comum para mim. Na hora de construir fichas para jogar, é preciso escolher conceitos que definam a natureza do personagem. Alguns formatos de jogos até pedem para se escolher um conceito para o comportamento superficial e outro para a natureza mais interna dele. E isso é ótimo para você poder escolher como vai jogar.
Sendo RPG um jogo de interpretação, há varias possibilidades a serem exploradas. Você pode ter vontade de fazer um personagem leve e carismático uma hora, e então sério e sádico na outra. Escolher os conceitos na construção da ficha evita que você fique preso a um personagem com que não se sente a vontade.
Eu não saberia dizer exatamente quando eu decidi migrar essa ideia para a escrita, mas ela se tornou de grande utilidade para delinear meus personagens. Em suma, o que tento fazer é resumi-los o máximo possível. Uma palavra ou frase curta basta. É importante não recair em papeis na trama ou maniqueísmos como “herói”, “vilão”, “mocinha”, exceto quando isso for intencional, pois há grande riscos de gerar personagens planos e chatos.
O conceito não precisa definir todo o personagem, mas sua base. Aquela ideia inicial de onde ele surgiu, e que não pode se perder no decorrer da história. Selecionei alguns exemplos para mostrar:
Faca
Esse personagem, em muitos sentidos, corta para os dois lados. Ele é afiado e é alguém que, se não for manejado com cuidado, pode te machucar.
Emocionalmente mimado
Ele é escravo das suas emoções. Um músico que, se não estiver completamente feliz, não consegue produzir. Por conta disso, é muito fácil para terceiros perturbarem sua produção artística.
I’m not a good person, i just fake really well
(Eu não sou uma pessoa boa, eu só imito muito bem) Um dos meus personagens favoritos, ele é completamente imoral. Polígamo, adultero, cafajeste, prostituto, golpista, ladrão, batedor de carteira e você pode ver isso em seus olhos, mas não em seus gestos, porque ele mente tão bem.
Qualquer frase ou palavra serve, desde que ela amarre o que é importante do personagem. Eu tenho uma inclinação a usar o inglês, por possuir certas expressões e palavras sem tradução satisfatória, mas isso sou eu. Cada um acaba encontrando seu próprio “estilo” na hora de conceituar personagens.
Black Orphan: ótimo exemplo de personagens parecidos com conceitos diferentes |
É importante ressaltar que o conceito de um personagem não visa tratar da personalidade dele, mas do que ele representa na história. Por exemplo, tenho um personagem cuja história gira em torno da repentina descoberta de que ele tem um filho adolescente, cujo conceito é “Parachute Parent” (pai de para-quedas). Ele tem uma personalidade própria, conflitos internos, outros relacionamentos e tudo isso é importante, mas jamais deve obscurecer o proposito do texto, que é trabalhar a estranheza de se ver como pai de súbito.
Eu poderia usar neste mesmo personagem um conceito como “Broken Ties” (Laços rompidos), por que ele se afastou da própria família repentinamente, ou “Imaginary Walls”, por ele construir todas essas paredes psicológicas ao redor dele, que o impedem de se envolver com os outros. O personagem seria o mesmo, e até mesmo os eventos que lhe acometem poderiam ser iguais, mas a história seria outra, com outro foco, outro conceito.
Que tal dar um conceito para os seus personagens antes de escrever sua história então?
1 comentários
Obrigada. Isso me parece que vai me ser muito útil;
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